22 julho 2009

cento e um

Um lapso. 
Lápis desenhando o risco tênue dos seus cílios inferiores (eu quis ser desenhista e mal virei um escritor). 
Escrever é desenhar com palavras na imaginação dos que nos lêem. Escrever é bênção e alívio, prazer e dor. De nunca acertar. De estar em busca todos os dias. De enfrentar falta de idéia, palavras que nunca preenchem, buraco na alma. Enfrentar, insônia adentro, o silêncio insuportável de uma rua inabitada. Cabeça inabitada. 
Então escrevo sobre:
Dificuldade de encontrar o outro que me foge eternamente por entre os dedos, vivo tapando sol com peneira, tentando te buscar de peneira e alçapões nas minhas mãos duras de quem ama até demais. Mas quando? O amor te machuca não é? O amor te arranha te cospe na cara te xinga na madrugada. Te liga e te acorda cheio de rancor, o amor, essa besta desvairada. Essa coisa feita sei lá de que substância que às vezes corrói e arde quando entra em contato com a pele. Eu só queria que. Só queria. Você e só. Só você só pra mim. Você só pra mim. Você pra mim e só. Doença esse amor compulsivo esse amor enjoado egoísta mesquinho. 
Quando você se esquece de mim e eu me esqueço de ser sã. O amor me possui me retorce e me transformo em monstra desvairada Medéia maluca de amor nas veias. Então é tarde. Nada segura ou contém. Jogo tudo no lixo, cuspo no seu nome, te juro o ódio mais horroroso. Aí é tarde. Porque você se volta contra o meu amor doente e não quer mais compactuar. 
E a Medéia vira cordeiro manso rapidinho pra não te perder. A Medéia morde a língua e esquece de tudo pra não te perder. Vira Ofélia num instante. E diz que estava possuída, sei lá o que me deu, essas coisas, a Lua, a TPM, acho que to no meu inferno astral. Não, aquela ali não era eu, não, imagine, como pode? Eu sou essa aqui, meu amor, você me conhece, não é? Eu jamais seria capaz de.

A sombra às vezes é tão imensa que até nós mesmos nos recusamos a olhá-la de frente.

7 comentários:

Lucas disse...

Do ódio à subserviência... onde foi parar o verdadeiro amor...?

Chico disse...

Esse negócio das alusões gregas... Lucas, o que você tem feito com sua pobre irmãzinha?

Lucas disse...

Ofélia é do 'Macbeth', na verdade. Mas ela conhece bem o teatro grego, não tenho nenhuma influência direta.

d scan disse...

Medéia do açúcar e afeto

sofia botelho disse...

Retificando: Ofélia é do Hamlet, Lulu.

natalia disse...

sofia : adorei seu texto !

também não estou nem sã nem salva.
mas de qualquer maneira uma salva de palmas !
bjs
natalia

Lucas disse...

ops